sexta-feira, 2 de fevereiro de 2018

O TRABALHO FEMININO – A CONSCIÊNCIA DO PRÓPRIO VALOR. Selvino Antonio Malfatti

















O reconhecimento do trabalho feminino, foi uma luta no sentido de fazê-lo existir visivelmente, reconhecê-lo política e juridicamente. Como se expressa Nancy Fraser:

“Por que o trabalho invisível, por excelência o trabalho doméstico e o cuidado, foi sempre atribuído às mulheres, um trabalho não reconhecido, naturalizado e desvalorizado”. (Fraser, 2014)

Apesar de a revolução feminista colocar na pauta das discussões radicalmente o sistema social patriarcal, alicerçado sobre a família e sobre o sujeito social universal: o trabalhador masculino, branco, operário, por tempo indeterminado. Implantou o sistema de dependência/independência, base do ocultamento e da desvalorização do trabalho feminino.

A questão para a explicação da situação do trabalho feminino é a insinuação de que o responsável é o sistema capitalista. Acontece que em todas as culturas e todas as formas de produção tiveram esta experiência. Até mesmo nos primitivos indígenas se encontra tal fato, como entre as tribos brasileiras, não tendo nada a ver com o capitalismo. A divisão das tarefas era feita por critérios de idade e sexo. E, há de se considerar que como pano de fundo, está a criação, alimentação e educação das crianças. Elas constituem o peso preponderante.

Entre os indígenas as mulheres, em grande parte, ocupavam-se dos trabalhos domésticos, cuidado das crianças e também agricultura. Os homens trabalhavam na derrubada da mata, plantio, caça e pesca, fabricação de canoas, armas de guerra, defender a aldeia. Como se vê, numa sociedade tribal, que nada tinha a ver com capitalismo, basicamente as mulheres ocupavam-se dos trabalhos domésticos e os homens atividades fora das habitações.

Entre os antigos predominava o sistema patriarcal. Os homens detinham o poder primário e ocupavam as funções políticas e religiosas que quase sempre se identificavam. Na família o pai mais antigo detinha o poder sobre escravos, filhos e mulheres. Aqui também, num sistema de sociedade patriarcal, às mulheres cabiam atividades domésticas e aos homens atividades fora da habitação.

Por que razão este modelo de trabalho, mulheres domésticas e homens em atividades extra domésticas, pode ser encontrada em praticamente todas as civilizações que saíram do estágio nômade para o sedentário até a era industrial ocidental. Qual a razão desta divisão? Que critério foi adotado?

Entendo que não se pode reduzir a uma razão só. Foram as mais diversas, cada povo, cada época adotou um critério seu. Podemos enumerar alguns: 1. Conveniência – Era conveniente que uma parte do grupo familiar cuidasse do lar e outra buscasse recursos fora de. O trabalho do lar coube às mulheres e crianças e o fora do lar aos homens. Com certeza seria inconveniente levar as crianças para o trabalho fora do lar. Isto provavelmente aconteceu com os grupos tribais 2. A dominação – o elemento masculino impôs pela força o condicionamento feminino no lar. Foi o que aconteceu, por exemplo, com as civilizações do oriente, como árabes e os bárbaros. As mulheres eram servas, senão escravas dos homens 3. Consentimento – os dois gêneros, masculino e feminino, decidiram consensualmente que fariam isso. Este modelo pode ser encontrado entre os hebreus, devido à ideia de igualdade de gêneros. Existem outros, mas estes dão uma ideia de multiplicidade de razões.


Mas por que somente com a revolução industrial aconteceu a paulatina liberação da mulher do lar? Inicialmente o trabalho feminino nas fábricas ajudava na renda familiar. Mas, com a abertura política liberal para participação de outras categorias na política, que não somente os proprietários, abriu-se espaço para que a mulher também tivesse representação. Primeiramente nos sindicatos e depois junto com o marido na política. Pouco a pouco, as mulheres passaram a participar autonomamente. Este processo levou um século, de 1830 a 1928. O que não havia sido feito em 5.000 anos, com a revolução industrial e abertura política liberal capitalista, se alcançou num século.

         Até a segunda década do século XX, o voto era tão somente extensivo ao sexo masculino. A extensão do voto às mulheres ocorre em 1918, àquelas que tivessem mais de 30 anos e que fossem proprietárias ou esposas de proprietários. A universalização do sufrágio na Inglaterra ocorre em 1928 com a Lei do “Flapper vote” (voto das moças).

Resumidamente o processo de abertura política seguiu a seguinte evolução: classe média rural, classe média urbana, operários, mulheres casadas e finalmente, o “flapper vote”, as solteiras. E precisamente é neste contexto que surge a liberação da mulher das atividades exclusivamente domésticas. Portanto, não foi o capitalismo que enclasurou as mulheres nas atividades domésticas. Ao contrário, o capitalismo ensejou a sua liberação. Não estamos dizendo que foi pacífico. Não. Houve muito derramamento de sangue feminino até a liberação.

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