sexta-feira, 26 de abril de 2019
Notre Dame e a elite econômica. José Mauricio de Carvalho – Academia de Letras de São João del-Rei
Elite econômica Brasil
França
A Catedral Notre-Dame de Paris; tornou-se notícia no mundo inteiro porque foi atingida recentemente, durante sua restauração, por um grande incêndio que destruiu o telhado e provocou danos no teto. A Igreja é uma edificação medieval cuja construção foi iniciada em 1163, durante o reinado de Luís VII. Ela se situa na Île de la Cité, assim denominada porque foi construída numa pequena ilha pluvial bem no centro da capital da França. A catedral de Paris foi edificada no momento áureo do estilo gótico, erguida como monumento fundamental da fé católica na França, planejada para favorecer a oração e a experiência religiosa cristã. No entanto, embora seja um monumento religioso, ligou-se, durante a história, intimamente a vida e a história da sociedade francesa. Por isso, sua importância para aquele país, além do sentido religioso, é o de monumento nacional e histórico da maior importância, sendo ao lado do Museu do Louvre, os maiores símbolos arquitetônicos daquele país.
A solução arquitetônica utilizada na construção daquela Igreja substituiu as paredes grossas dos templos edificados antes, por colunas altas e arcos capazes de sustentar o peso dos telhados. Por isso, catedrais como Notre Dame de Paris ganharam um aspecto leve, com janelas amplas e altas, capazes de promover a iluminação no interior e criar um clima propício de oração. Na Catedral de Paris essas janelas foram ornamentadas com magníficos vitrais coloridos que filtram a luz natural, e criam um maravilhoso efeito visual no interior. O magnífico edifício foi reconhecido como patrimônio histórico da humanidade em 1991, por isso é natural a preocupação mundial com o incêndio e a mobilização ocorrida em vários países para sua recuperação.
Entretanto, tão impressionante quanto o próprio incêndio, foi a imediata reação da elite econômica francesa. Em menos de vinte e quatro horas as pessoas mais ricas do país já haviam doado 750 milhões de euros, algo como 3 bilhões e 300 milhões de reais, seja, mais de 50 por cento do valor que o governo brasileiro destinará este ano para arrumar todas as nossas estradas. Contudo, o que quero destacar não é o valor que será necessário para restaurar aquele monumento histórico, mas o fato das cinco maiores fortunas da França se mobilizarem imediatamente para assegurar a recuperação do monumento, ajuda completa por grandes empresas.
O fato, que não deixa de sensibilizar a todos os que se preocupam com a preservação dos monumentos históricos, também colocou em evidência a diferença entre uma elite econômica comprometida com seu país e uma que não é.
Quando um incêndio de grandes proporções destruiu o Museu Nacional do Brasil, em 2 de setembro do ano passado, destruindo a quase totalidade do acervo histórico e científico colecionado durante dois séculos e o magnífico prédio que foi a residência oficial da família real durante o Império, os milionários do Brasil não se manifestaram. Ainda que se possa dizer que a Catedral de Paris é um monumento histórico comparativamente mais importante que o Museu Nacional do Brasil, para nosso país o Museu e seu acervo são tão importantes quanto a Catedral para a França.
No magnífico livro A rebelião das massas, Ortega y Gasset comentou o papel das minorias, ou seja o protagonismo histórico das minorias nas diferentes áreas da cultura. Cabe a elas liderar a sociedade. O filósofo não falava de uma única minoria, mas de várias, porque não há uma única elite, mas muitas na defesa da excelência cultural e sobretudo no papel de liderança que elas exercem e precisam exercer. Nesse sentido, parece que os milionários franceses assumiram o protagonismo do processo de restauro, isto é, agiram como liderança responsável, pelo menos nesse caso. É claro que agora os governos e os cidadãos comuns também irão se mobilizar, fazendo a parte que cabe aos liderados. A liderança do processo de reconstrução foi assumida por quem de direito, pela minoria econômica da França, comprometida com a vida e a história do país.
A diferença de atitude, em episódio similar em nosso país, mostra a triste e lamentável diferença de mentalidade e a falta de compromisso da nossa elite econômica com o destino do país e do seu povo.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Postagens mais vistas
-
Com certeza todos se lembram do belíssimo filme “O Nome da Rosa“ baseado no romance de Humberto Eco, filósofo e literato italiano. Nesse fil...
-
Por ocasião das cerimônias fúnebres do ex-presidente Itamar Franco, (falecido em 2 e cremado em 4 de julho deste) a cujos atos fúnebres c...
-
Resumo: Paolo Rossi foi um pensador sui generis. Ao mesmo tempo em que se preocupava com a questão da ciência procurava extrair desta...
A pergunta que não cala, porque imediatamente após o incêndio houveram tantas e grandes doações?
ResponderExcluirA resposta com certeza será a diferença entre Brasil e França, credibilidade nas instituições, o povo confia e sabe que os valores doados, serão para restaurar o museu.
Eis a resposta, CREDIBILIDADE, a doação ser aplicada onde houver a necessidade.
ExcluirA arquitetura é belíssima, a catedral um grande monumento, a elite usou medidas diferentes na cooperação para a reconstrução, porquê será?
ResponderExcluirÉ um monumento nacional e histórico, precisa ser reconstruído.
ResponderExcluirPovo educado sabe o valor, não deixa ser destruido ou esquecido.
A reconstrução conta a história de uma época, se deixarem se perderá,as novas gerações perderão.
ExcluirUm luxo, símbolo de religião e poder.
ResponderExcluirMuito interessante, otimo artigo.
ResponderExcluir