O
livro Quilombo do Campo Grande
apresenta fatos e documentos interessantes sobre a escravidão na região das
Minas Gerais. O autor, Tarcísio
Martins, esclarece que é preciso distinguir os negros que vieram para Minas
Gerais, fundamentalmente bantos, dos grupos sudaneses que foram para o
nordeste. Essa seria realidade irrelevante não fosse o papel singular que a
instituição teve em Minas.
O
escravo nas Minas, observou Martins, não vivia como nos engenhos cortando cana,
plantando roça, acendendo as fornalhas e limpando objetos. O trabalho nas Minas
era muito insalubre e pouco produtivo, nada rendia ao dono, a não ser que o
negro encontrasse um rico filão de ouro ou preciosos diamantes. Ou então se ele
não garimpasse certa quantidade de ouro. Assim, era essencial motivar os negros
a encontrar e retirar quantidades consideráveis de metais preciosos que
tornariam rico o dono ou explorador do local. Essa circunstância tornou a
libertação de escravos um fato mais comum em Minas do que nos outros estados
brasileiros. Explica o autor: “a possibilidade do negro se tornar livre nas
Minas Gerais era infinitamente maior do que no engenho. O hábito de libertar o
negro que achasse um grande veio de ouro ou um grande diamante foi costume que
se consagrou de fato e direito”. (MARTINS, 2008, p. 266) Dessa forma, o
preceito de servir toda a vida foi quebrado na prática.
Outra
diferença marcante da escravidão em Minas era que, enquanto no nordeste o
Senhor de engenho, vinha para o Brasil com toda a família o deslocamento para
as Minas era feito só. Então, logo que se estabeleciam, esses aventureiros portugueses
compravam negras jovens com quem coabitavam. Eles “ligavam-se a negras
africanas ou mulatas, que por sua procura, atingiam altíssimos preços e dada a
sua fecundidade, a população aumentava rapidamente de pardos”. (Id., p. 267)
Essa
realidade singular colocava o negro escravo numa condição diferente de outras
praças, quer porque muitos realmente compravam a liberdade e não eram raros os
que enriqueciam depois de libertos, como porque muitas negras assumiam a
condição de esposas de fato, ainda que não de direito, e seus filhos eram inseridos
na sociedade. O filho do contratador João Fernandes de Oliveira com a mestiça
Chica da Silva, por exemplo, foi “ungido cavaleiro da Ordem de Cristo,
recebendo o hábito de Cristo só reservado aos brancos nobres, preparando-o, na
verdade, para ser o herdeiro do Morgado de Grijó, a maior fortuna privada de
Portugal na época”. (Id., p. 274).
Essa
situação de alteração na vida social levou ao apartheid mineiro que foi o impedimento dos mulatos ocuparem cargos
públicos importantes nas vilas, considerando que esse grupo se tornara
numeroso, rico e influente, levando os portugueses brancos a assegurar o
poderio político nas vilas, já que tinham a posição econômica ameaçada por esses
mestiços. Essa circunstância fez com que a argumentação contra a inumanidade da
escravidão ou sua abolição não fosse tema de debates na região, até porque era
possível ser contemplado pela boa sorte de encontrar uma pedra ou um veio de
ouro que tornasse livre e, muitas vezes, rico, um antigo escravo. A preocupação
reaparece quando as Minas se esgotaram.
Toda
a elite mineira, mestiça ou não descomprometia-se do trabalho produtivo
considerado coisa de escravo. Engrossaram aquela nobreza ociosa que o Marquês
de Pombal desejou erradicar e que foi tema dos teatros da Arcádia. No caso,
despreocupação com o trabalho produtivo não se originava dos hábitos medievais,
mas da associação entre trabalho manual e a condição de escravo. Também
contribuiu para essa mentalidade o catolicismo tradicional com suas festas
suntuárias, onde a comunidade dispendia recursos não compatíveis com sua
realidade econômica. O livro de Martins ajuda a entender a singularidade da
escravidão em Minas.
Mas muito interessante, sempre estamos apreendendo.
ResponderExcluirMesmo escravos a ideia era que poderiam um dia conquistar a LIBERDADE,havia o diferencial, A ESPERANÇA.
ResponderExcluirA história explicada, houve muitas formas de escravidão.
ResponderExcluirGostei, não estudamos sobre as regiões e as diversas formas de escravidão.
ResponderExcluirSucesso para o "Quilombo de Campo Grande".
ResponderExcluirGrande pesquisa, muito sucesso, são informações preciosas, uma aprendizagem.
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