Vamos tratar, neste texto,
do impacto que a crise de cultura teve na vida sociopolítica do ocidente. Sabemos
que o Estado Moderno se consolidou depois de forte empenho de seus líderes centrais.
Como parte da consolidação do poder centralizado firmaram-se inicialmente
padrões de medida, distância, superfície e volume que promoveram a
uniformização de procedimentos necessários à centralização conduzida por
monarcas absolutos. Essas práticas serviram para dar uniformidade de
procedimentos em benefício da administração central.
A atuação do Estado
precisava ter uma padronização capaz de assegurar homogeneidade de
procedimentos para promover uma atuação uniforme do poder central em todo o território.
Por isso, Bauman comentou no livro Globalização que (Rio de Janeiro:
Zahar, 1999, p. 37): “o que estava em jogo na principal batalha dessa guerra
era o direito de controlar o ofício cartográfico.” Esse controle significava
que o poder central precisava que fosse reconhecida sua interpretação das
fronteiras contra qualquer outro entendimento que dele retirasse parte de seu
território ou o colocasse fora de sua administração. Isso fazia todo sentido
dentro do propósito de centralização do poder contra uma forma de poder
regionalizado ou feudal que vigorou durante a Idade Média.
A diferença de representação
do território significava a afirmação do poder central, em detrimento da
perspectiva dos cidadãos e significava a afirmação de um olhar sobre todos os
outros. E a diferença precisou ser superada à força, pois (id., p. 39): “nem
toda criatura humana ocupa o mesmo lugar e, portanto, contempla o mundo da
mesma perspectiva, nem todas as visões se equivalem.” O esforço de imposição da
visão do poder central permitia superar as diferentes perspectivas que
produziam os diversos modos de representação do território.
A centralização do poder
pode ser identificada com o processo de modernização, que significava tornar
hegemônica e eliminar toda representação do espaço que não aquela do monarca
absoluto. Assim, o processo consistia em impor que a leitura do espaço fosse
feita a partir do mapa oficial e não o contrário, isto é, deixar que a
representação do espaço fosse elaborada a partir de olhares locais.
A construção dos Estados pela
implantação de um plano de centralização e racionalização administrativa acabou
sendo projetado também para as cidades. Técnicos e governantes criticavam os
urbos espontâneos da Idade Média e propunham como alternativa as cidades planejadas,
conforme um código já existente no século XVIII que estabelecia, na reprodução
feita por Bauman, que (id., p. 43): “serão erguidos armazéns públicos para
guardar todas as provisões necessárias e com salas de reuniões públicas – tudo
uniformizado e de aparência agradável. Fora desse círculo serão dispostos
regularmente os distritos urbanos – todos do mesmo tamanho, de forma similar e
divididos por ruas iguais.”
Os habitantes dessa cidade
teriam habitações conforme suas ocupações e responsabilidades, formando
quarteirões mais sofisticados que outros, embora todos assegurando a dignidade
dos moradores. A organização da cidade precisava considerar também as funções
de trabalho, vida doméstica, compras, culto, esporte, etc. Quanto ao lixo
humano produzido, a saber, velhos improdutivos, doentes em geral, pessoas com
transtornos mentais, eles serão recolhidos em instituições próprias e isoladas
das cidades. Todo esse esforço de controle e planejamento não tinha
correspondência com a realidade existente.
O esforço descrito
significava um novo planejamento da vida social e política pela razão, como
ocorria em outras partes da vida cultural. Temos um esforço moderno para
racionalizar a criação e uso do espaço nacional e urbano, inclusive dele
afastando o lixo humano. Esse esforço foi confirmado no século passado com a
arquitetura moderna onde nomes célebres como Le Corbusier ratificaram a
proposta de planejamento urbano e (id., p. 49): “proferiu uma sentença de morte
contra as cidades existentes – refugo podre de história rebelde, descuidada,
infeliz e urbanisticamente ignorante.”
A crise que assistimos
alcança essa área da cultura devido a grandes mudanças na vida social com a
globalização da economia e, paradoxalmente, com o fechamento das fronteiras
nacionais a migrantes vindos de áreas de guerras ou pouco desenvolvidas
constantes nesse momento da história. O afastamento dos setores produtivos da
realidade local retirou o compromisso da elite econômica com os problemas do
povo, esse permaneceu, ao contrário, vinculado aos locais onde habita. Por
outro lado, o enfraquecimento dos processos econômicos minou a sustentação do
Estado do Bem estar social e promoveu a ascensão da extrema direita em diversos
países do mundo ou mesmo na União Europeia como acaba de ocorrer.
Isso aconteceu em países onde o poder central destruiu o sistema feudal, neutralizando o sistema representativo. Onde este surgiu o poder central do Estado foi submetido à gerência da representação. O primeiro caso tem como modelo a França e o segundo a Inglaterra.
ResponderExcluirDe fato, a superação do mundo feudal se dá principalmente nesses dois países, mas a atual desvinculação do capítal com um território pode ser considerada uma característica geral de nosso tempo. Mais comum nos países desenvolvidos, mas também visto naqueles em desenvolvimento.
ResponderExcluirE porquê países em desenvolvimento seguem o que não deu certo, poder central só beneficia a quem mesmo?
ExcluirIsto é muito importante, aprendizagem.
ResponderExcluirObrigado professores.
Muito interessante ler com calma para entender, as mudanças sempre trazem o jogo do poder.
ResponderExcluirQuem pensa no povão, torna- los capacitados, ter educação, ser útil na família e sociedade.
O povo só aparece nas eleições, não esqueça.
ExcluirNão sabem nem o valor que é o trabalho, vamos alimenta- los com auxílios, serão eternos eleitores.
Não foi o afastamento dos setores produtivos, que mudou a realidade, falando do Brasil, foi está política de homens que se vendem, falta de ética e respeito ao eleitor.
ResponderExcluirNão vamos dourar a pílula, quem cuidou de salvar VIDAS no Río Grande do Sul?
O povo, os empresários, a população..
Tudo tem explicação?
ResponderExcluirTeorias....onde está o estudo para a transformação?
Talvez o que melhor explica é a ideia de patrimonialismo de Max Weber. Nos países patrimonialistas o Estado monopolizou tudo.
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ResponderExcluirO Estado monopolizou tudo, se não é totalitário, falta reação dos representantes do povo.
A Teoria das Elites é um ótimo artigo, SEMPRE muito atual.