sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

FIDELIDADE E COMPORTAMENTO POLÍTICO. Selvino Antonio Malfatti.




Se pensarmos que fidelidade só diz respeito à relação entre marido e esposa estamos enganados por que é incompleta. Fidelidade é uma categoria ética que pode ser também jurídica. Mas antes de tudo é ética. Por isso, pouco ajuda estabelecer leis para regular o comportamento ético. Este brota de dentro, do coração ou da razão. Por isso mesmo, a fidelidade diz respeito à relação entre o empregado e patrão, entre professor e aluno e evidentemente entre marido e mulher. Mas há uma categoria social que faz que não sabe que estão vinculados por uma ética de fidelidade. Dizia o chanceler Bismark: nunca se mente tanto como antes das eleições, durante a guerra e depois de uma pescaria. Fiquemos com a primeira situação: a relação entre candidato e eleitor. Já ouviram falar de algum candidato ser preso por causa das mentiras de campanha? E, no entanto, deveria haver uma relação de fidelidade entre os que prometem e aquilo que prometem com os que aceitam o proposto acreditando na sinceridade. Ou a ética e a política residem em quartos separados? Se de fato houvesse um casamento entre os eleitores e os políticos, isto é, uma relação de dependência como se crê, poderíamos, nós eleitores levá-los perante os tribunais. E a lei prevê esta dependência e consagra o princípio ético. Com efeito, se todo poder emana do povo, os que o exercem são dependentes de quem os elegeu e portanto, têm um dever de fidelidade a este povo. Foram eleitos para o bem dos cidadãos e consequentemente deve agir assim.
No entanto, se observarmos a realidade o quadro é bem outro. Uma vez eleito, o candidato adquire vida própria, só se preocupa com seu próprio bem, de seus parentes e amigos, rouba, trapaça, desvia, enfim, age como o antípoda da ética. E nem povo e nem lei conseguem frear este desvario antiético. A fidelidade é jogada pela janela e a ética violentada, humilhada e pisoteada publicamente.
E surge então a pergunta? Por que pode acontecer isto? Se nem a lei e nem a filosofia conseguem explicar, talvez a sociologia nos lance uma luz.
O comportamento social está alicerçado sobre três categorias populacionais. A primeira categoria que poderíamos denominar de Alfa (trendsetter). São atípicos, não seguem o padrão e não se deixam influenciar, criam comportamentos. Intermediariamente alocam-se os Betas (early adopter) que captam o comportamento dos alfas e o dissemina para os demais, menos para os Alfas. E por fim temos a categoria comportamental dos Gamas (mainstream), dos comuns, da maioria que seguem o que os Betas lhes transmitem. Não influenciam nem os Betas e muito menos os Alfas. Estes comportamentos podem varias de conteúdo para conteúdo. Uns podem Alfas em economia, e Gamas na política. Outros podem ser Betas na religião, e Gamas em arte.
No caso da política se formos aplicar a teoria dos comportamentos, pode-se constatar que os Alfas são autônomos em relação aos Gamas e mandam seus padrões através dos Betas que se abstém de criticar os Alfas por que é deles que dependem para sua sobrevivência, os quais passam as orientações para os Gamas: maioria incapaz de mudar a situação. O povo- os Gamas, a mídia - os Betas e os políticos - os Alfas.

Se os Alfas, por uma educação deficiente, ou ideologia não comprometida com a democracia, emitir tipos de comportamentos antiéticos, estes serão levados para os Gamas pelos Betas. Os comuns acham “normal” este tipo de comportamento e não reagem a ele. E se isto se incrustar nos líderes políticos, através de seus partidos, esta oligarquia apertará as tenazes de ferro sobre o povo e o como diria Robert Michel. E a fidelidade política é mandada para as cucuias.

sexta-feira, 23 de janeiro de 2015

O fundamentalismo e o terrorismo religioso. José Maurício de Carvalho


Foi um choque para os franceses e, para os ocidentais em geral, o ataque executado esta semana pelos irmãos Said e Chérif Kouachi ao jornal parisiense Charles Hebdo. Como o assassinato dos jornalistas e policiais pelos dois irmãos foi executado por quem tem treinamento militar, veio a tona que eles foram treinados pela Al Qaeda da Península Ibérica. A organização assumiu a responsabilidade pelo atentado como represália às ofensas feitas ao Profeta Maomé. Aliás, o mesmo jornal foi alvo de outro ataque terrorista que destruiu sua redação em 2011, embora na ocasião sem causar nenhuma morte. Agora a ação foi radical contra os jornalistas e matou boa parte da equipe que compunha o hebdomadário.
A razão alegada para o ataque foram as charges ofensivas ao profeta Maomé, uma marca do jornal francês. Os jornalistas comentaram indignados o atentado levando o assunto para a defesa da liberdade de expressão e de opinião, valores do ocidente. Contudo, defender a liberdade de expressão só faz sentido num determinado contexto, e, nos dois casos, o problema foi muito mais grave que o desrespeito à liberdade de expressão. O segundo ataque sequer foi aos jornalistas. Para entender o fato temos que olhá-lo noutra perspectiva à procura dos motivos que levam a tais acontecimentos. Ainda que exista razões mais amplas que as alegadas para os ataques como interesses estratégicos envolvendo a criação de Estados Islâmicos ou repúdio puro e simples ao modo de vida ocidental (inclusive à liberdade de imprensa), esses outros motivos têm origem religiosa e contrapõe, pelo menos parte dos muçulmanos fundamentalistas, ao modo de vida ocidental. Assim para entender esse movimento precisamos ter claro que não há terrorismo religioso sem fundamentalismo, embora nem todo fundamentalismo religioso leve ao terrorismo. Parece que o fundamentalismo religioso é o problema a ser enfrentado e no caso, o fundamentalismo islamismo.
O massacre no jornal francês seguido do ataque ao supermercado Kosher, onde outro radical (Amedy Coulibaly) matou 4 pessoas antes de ser morto pela polícia, obriga à seguinte questão: faz sentido uma interpretação religiosa do texto sagrado que leve ao ódio ao diferente e estimule o assassinato como nos dois acontecimentos? Não há na moral islâmica (deixemos de lado a moral filosófica que normalmente importa pouco aos fundamentalistas) nenhuma restrição à violência e defesa do respeito ao semelhante como algo sagrado a ser preservado? Como a interpretação dos textos sagrados, de qualquer religião, é sempre trabalho do homem, o fato indica duas coisas. Primeiro que é necessário despender todo esforço e inteligência humanas no sentido de compreender os textos sagrados (de qualquer religião). Esse trabalho, muitas vezes pouco valorizado, é essencial para melhor compreensão desses textos. Segundo que se mesmo as interpretações desses textos cercadas de todo cuidado histórico, literário, hermenêutico, filosófico não assegura um conhecimento perfeito e completo da vontade de Deus. A leitura fundamentalista, quase sempre literal e pouco crítica conduzirá, a erros grosseiros de interpretação.

Considerando-se que o islamismo não é uma religião do ódio e da barbárie, caberá as suas lideranças religiosas se contraporem de forma clara e direta a essas interpretações radicais. Se não o fizerem serão cúmplices desses atos. A melhor resposta à ignorância praticada em nome de Deus é a inteligência colocada a serviço de Deus. Está na inteligência e no estudo as melhores de chances de termos um tempo de maior tolerância e paz entre os povos, cada qual vivendo sua fé e direção. E para os crente do mundo valerão os muitos caminhos que nos conduzem verdadeiramente até Deus.

sexta-feira, 16 de janeiro de 2015

TV SOCIAL: CONTEÚDO E MEIO. Selvino Antonio Malfatti.





















Fala-se muito atualmente em TV social. Afinal o que é de fato isto, pois não é de sua própria natureza o caráter social da TV? Na medida em que sincroniza as pulsações de uma comunidade, a TV por si já não é uma instituição coletiva? Com efeito, assim é, mas a TV social é algo bem distinto da TV geral.
A TV social é um intercâmbio constante entre o público assistente da televisão e o programa televisivo. Neste sentido, inclui o comportamento social, dispositivos e redes. Incorpora network, facebook e twitter e outras ferramentas. É como se dois programas funcionassem simultaneamente. Enquanto você vê ou assiste algo, pode paralelamente ver e assistir outro e guardar os dados do segundo ou mesmo utilizá-los no momento, caso seja protagonista do programa em execução. Então, TV social é a interação entre televisão e o público através da web. A estrutura não é hierárquica, isto é, vertical, mas horizontal. Por isso, é mais uma não estrutura do que estrutura. Os limites que se estabelecem não são de separação e sim de identidade.
Isto significa que uma programação televisiva pode sofrer redirecionamentos durante a execução e ser reprogramada tendo em vista as respostas sociais manifestadas através da web. Evidentemente que o interesse não é o público que assiste, mas o interesse do público que se manifesta. Um bom exemplo, embora não seja genuinamente de TV social, é o caso da novela brasileira. Ela muda e toma direções conforme o público aprova, desaprova ou deseja.
Tudo indica que os textos televisivos fogem do controle da tela e passam a ter vida própria. McLuhan havia dito que o “meio é a mensagem”. No entanto, atualmente transmutou-se para o “conteúdo é o meio”. Busca-se o que agrada, o conteúdo, e através dele se agrada, pelo meio. Isto está se tornando tão crucial que o conteúdo se desprende de seu recipiente. Está acontecendo com a TV social aquilo que se teme com a inteligência artificial: que domine seu criador. Mas este cenário não é tão simples como se descreve. Ocorre que entram milhões ou bilhões de atores cada um deles opinando de acordo com os demais e os demais mudam conforme a opinião expressa pelos outros, que por sua vez, também mudam ao ouvir a opinião dos demais e assim sucessivamente até chegar-se ao estado caótico da Torre de Babel. Este processo não tem rumo, nem desfecho. Tudo pode acontecer.
O importante não é aprovar ou condenar a TV social. O melhor que se pode fazer é refletir sobre esta comunidade que se formou online, as formas de co-envolvimento dos atores e dos programas, em alguns casos, nasce uma relação profunda, em outros superficiais. Também se pode considerar o fato de que em alguns casos é possível se ativar, em outros não. Às vezes diverte, em outras ocasiões enoja. Há casos em que desperta paixões intensas e em outros, ironia. Uns são populares, outros elitistas. Para alguns é passatempo, divertimento, mas para outros é a condescendência de um passatempo proibido.
Na modalidade clássica da TV havia apenas espectadores passivos. Na TV social, ao contrário são os autores que devem se tornar passivos, pois é tamanha a participação dos espectadores através de comentários via  telefone- convencionais ou celulares- facebook, twitter, blogs,twoo, skype e outros que os conteúdos produzidos por tais meios são independentes da vontade dos autores. São produtos derivados de produtos muitas vezes completamente diversos dos produzidos pelos autores televisivos. Formam-se verdadeiras redes. As principais identificáveis são:
1.    As redes comunitárias: envolvem bairros, cidades ou regiões. Defendem e trazem à tona interesses comuns.
2.    Redes profissionais: caracterizadas por networkin, como o linkedin, estabelecendo vínculos ou contatos entre indivíduos parta lucros pessoas ou profissionais.
3.    Redes sociais com objetivos diversos, como bate-papo, jogar, intercambiar.

A única forma atualmente de se sintonizar com o mundo que nos cerca – isto vale para políticos, empreendedores, mestres, investidores – é lançar mão das diversas formas de mediação: mais diretas, mais instantâneas, mais simples, mais velozes. 

sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

O público e o privado. José Maurício de Carvalho



A passagem de ano para 2015 foi um momento de renovar as esperanças numa vida melhor e num futuro menos incerto. E chegou com belas festas pelo mundo. Esperamos mais momentos felizes e menos sofrimentos no ano que se inicia. O homem exercita todo início de ano a aprendizagem da esperança e nunca parece aprender o suficiente dessa arte, pois a vida sempre surpreende de um ou outro modo. Mesmo depois de ultrapassar os cinquenta ou sessenta anos, ainda nos encantamos com as boas surpresas e nos angustiamos na iminência do sofrimento. E embora muito do que vivemos simplesmente nos acontece independente de nossas ações, boa parte de nossos momentos mais ou menos felizes dependem das escolhas que fazemos.
Em meio aos votos de felicitações do novo ano, multiplicaram-se nas redes sociais selfs e fotos da vida privada, popularizando um novo hábito: o de dar publicidade aos acontecimentos da vida particular. Será essa mania parte de um novo estilo de viver no século XXI? O que as pessoas esperam com esse novo hábito? O que pode interessar ao público em geral o prato do jantar de alguém, o retrato do vestido, o mostrar que está soltando foguete, ou bebendo em um clube, ou ainda dando um beijo?  Até pouco tempo era elegante manter no âmbito privado aquilo que era da esfera particular. Elegante e sábio, pois podia-se ser vítima de exposição indevida. Havia mesmo o temor de que a vida particular das pessoas fosse invadida por algum tipo de bisbilhoteiro eletrônico. A literatura do final do século que findou explorou e criticou a existência de um poder intrometesse nos detalhes particulares da vida. Refiro-me particularmente ao Big Brother (não o reality show), mas ao personagem de Georg Orwell, expressão de uma tirania terrível. No romance de Orwell havia em todo canto aparelhos de TV que repetiam a frase "o Grande Irmão está te observando", ele zela por você. Ninguém estava a salvo daquele olhar indiscreto.
No mundo real, até pouco tempo apenas personalidades públicas tinham a vida penetrada pelas câmaras de jornalistas indiscretos e fotógrafos de ocasião, sempre prontos a ganhar notoriedade e algum dinheiro com a exposição de alguma figura pública. Essa exposição sempre incomodou os famosos, pois tinham colocado a público coisas íntimas: o decote que mostrava mais do que devia, a calcinha que surgia com um vento indiscreto, a nudez colhida na piscina particular, etc. Mais que os famosos, o políticos sempre detestaram a publicidade da vida particular, pois ela podia trazer algo que não agradasse os eleitores ou que agradasse à Polícia.
Pois bem, de uma hora para outra, sem que fosse necessário nenhum poder total, nem nenhum bisbilhoteiro de plantão, as pessoas começaram a expor a vida particular: seus passeios, seus amigos, sua comida, sua casa, seus bichinhos de estimação, suas tatuagens, etc. Aspectos íntimos da vida.

Dentre as esperanças de ano novo permito-me também esse voto, que essa mistura entre o privado e o público vista nas redes sociais, não se estenda para outros aspectos da vida diária, pois é preciso distinguir que o que se pode fazer na sala de casa não é o mesmo que se pode fazer na rua, que os bens públicos não podem ser tratados como os particulares, que não se pode usar ruas e praças como coisas privadas, pois a mistura entre o público e o privado é o desastre da vida social.

quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

DIA DA CONFRATERNIZAÇÃO UNIVERSAL: 1º DO ANO. Selvino Antonio Malfatti.




O Dia da Confraternização Universal, que é celebrada universalmente em 1º de janeiro da nossa era, não necessariamente coincide com o primeiro dia do ano em outros povos. Para nós ocidentais identifica-se pois o primero dia do ano é também o Dia da Confraternização Universal. Mas, para uma parte da humanidade, o dia 1º do ano não é em 1º de janeiro e por isso não concide com o dia da Confraternização Universal.

O costume de se celebrar um novo ciclo, o dia 1º do ano, está ligado a dois fatores: o ecológico e o religioso, e atualmente acrescente-se o cultural. Todos foram foram associados.
Um dos mais remotos martcos que conhecemos foi na Babilônia que marcava o início da primavera, com data de 23 de março da era cristã. Já os gregos comemoravam o renascimento do deus Dionísio, com desfile de um bebê no cesto. Os egípcios festejavam o novo ano quando a estrela Sírius surgia no horizonte de Mênfis, cidade dos faraós. A data de 16 de julho coincidia com enchente anual do rio Nilo.
Já em Roma o imperador Júlio Cesar, 46 a.C., dedicou esta data ao deus Jano, deus dos portões. Daí o nome de janeiro.
Na China, pelo nosso calendário, seria no fim de janeiro ou início de fevereiro, pois seu calendário segue o ciclo lunar.
Os Hebreus o celebram no primeiro dia do mês de Tishrei, isto equivaleria para nós  a meados de setembro ou começo de outubro. É denominado de Rhos Hashaná, ou Festa das Trombetas.
Já para os islâmicos, o ano novo cai em maio pelo nosso calendário. Isto por que está baseado no aniversário de Hégira (emigração), equivalente ao ano 622 da era cristã. Neste ano o profeta Maomé sai de Meca e se estabelece em Medina.
Estes são alguns exemplos das disparidades de datas quanto ao Dia da Confraternização Universal. No entanto, a data existe como instituição e não como data. Ela começou a existir a partir de 21 de setembro de 1981, mas foi reconhecido pela ONU em 1º de janeiro. Antes disso, o papa PAULO VI, em 1967, propôs uma data para promover votos de alegria e felicitações entre as nações e em 1981 a data foi consagrada pelo ONU.
Evidentemente que há uma estreita ligação entre o Dia da Fraternidade Universal e a Declaração Universal dos Direitos do Homem, também da Organização das Nações Unidas, de 1948. Pode-se dizer que a data de 1º de janeiro seja uma continuidade e uma consagração do conteúdo da Declaração.


La Déclaration universelle des droits de l’homme

Déclaration universelle des droits de l'homme
Article premier
Tous les êtres humains naissent libres et égaux en dignité et en droits. Ils sont doués de raison et de conscience et doivent agir les uns envers les autres dans un esprit de fraternité.
Article 2
Chacun peut se prévaloir de tous les droits et de toutes les libertés proclamés dans la présente Déclaration, sans distinction aucune, notamment de race, de couleur, de sexe, de langue, de religion, d'opinion politique ou de toute autre opinion, d'origine nationale ou sociale, de fortune, de naissance ou de toute autre situation.
De plus, il ne sera fait aucune distinction fondée sur le statut politique, juridique ou international du pays ou du territoire dont une personne est ressortissante, que ce pays ou territoire soit indépendant, sous tutelle, non autonome ou soumis à une limitation quelconque de souveraineté.
Article 3......
http://www.lexilogos.com/declaration/texte_francais.htm





terça-feira, 23 de dezembro de 2014

Jesus. José Mauricio de Carvalho



Ele nasceu em Belém e foi criado em Nazaré, uma pequena cidade da Galiléia, há 2014 anos. Muito pouco se sabe, com certeza, de sua trajetória histórica, quase nada de seu nascimento e infância. Seus primeiros anos foram cercados do mistério representado pela enormidade de um Deus que se faz homem. Um acontecimento que desafia a inteligência. Durante sua gestação sua presença ficou restrita à confiança de sua mãe Maria na promessa de Deus. Ela no íntimo aguardou a realização da promessa feita pelo anjo (Lc. 1, 46-55) e depois do nascimento, sem alarde, criou o menino. O Pai carpinteiro lhe deu o nome e o educou na lei judaica. E Jesus, mais tarde, se valeu da imagem desse carpinteiro para ensinar o que toda inteligência procura, o que todo homem aspira conhecer: o princípio fundador de tudo, uma razão segura para viver pode ser chamado de Pai. Onde depositar a crença de que vale a pena viver? O conhecimento do arquétipo que tanto mexeu com os gregos Jesus anunciou de forma simples e fácil: qual é o princípio no qual nascemos e morremos? O princípio é o Pai, podemos chamá-lo assim, o entenderemos melhor assim.
Crescido Jesus deixou a lida diária do carpinteiro depois de ser batizado por João Batista. Trabalhara muitos anos fazendo cidades, mas precisava, depois de batizado, de um tempo para trabalhar o coração das pessoas. Ao aparecer adulto anunciando a boa notícia, uma forma nova de ler a lei judaica, causou desconfiança entre os seus. E havia razão para a desconfiança. Jesus, o filho de José, vinha da Galiléia, de uma cidade pequenina chamada Nazaré. Seu pai era um humilde carpinteiro. Não era nobre, nem sacerdote, nem sequer fora criado nos palácios.
É o nascimento desta criança, cercada do mistério que envolve a aparição humana de Deus, o episódio que celebramos em dezembro. É o natal deste menino simples e pacífico que a humanidade celebra. E por que ainda precisamos celebrar seu nascimento? Porque é para Ele que olhamos quando sentimos a necessidade de recriar e recomeçar. É Ele que veio para renovar para melhor todas as coisas, é Ele a esperança numa fé que livra o mundo da maldade. Esse mundo acordou hoje com mais notícia de corrupção, descobriu assustado a morte de mais de cem crianças por um grupo religioso que diz agir em nome de Deus. Sim, necessitamos celebrar o natal, pois é para esse menino que olha o homem quando sente que precisa de um mundo melhor.
Então que celebremos o Natal, revivamos esse episódio de mais de dois mil anos. Precisamos Vê-lo para enxergar além da rotina, para iluminar além daquilo que se manifesta na fenomenalidade da existência, para encher o coração da esperança de um dia vivermos em paz. Necessitamos Dele para fortalecer a esperança que a vida comum e imanente das coisas não fornece. Precisamos Dele para nos ensinar a ser melhores, para fortalecer nossa fraqueza, para mostrar a rota para um mundo mais gentil, mais justo e fraterno, o mundo que sonhamos em nosso íntimo e uma vez por ano ousamos apresentá-lo aos demais em forma de uma festa: natal.

Para enxergar o sentido desse natalício, para falar do menino que dá ao viver as melhores possibilidades, é necessário acreditar no que o homem pode realizar de melhor.





                 

RETRATO FALADO DE CRISTO PELO SENADOR ROMANO PÚBLIUS LENTULUS
EM CARTA DIRIGIDA A TIBÉRIO CÉSAR
“Sabendo que desejas conhecer quanto vou narrar, existindo nos nossos tempos um homem, o qual vive atualmente de grandes virtudes, chamado JESUS, que pelo povo e inculcado o Profeta da verdade Seus discípulos dizem que e filho de Deus, Criador do céu e da terra e de todas as coisas que nela se acham e que nela tenham estado Em verdade, o Cesar, cada dia se ouvem coisas maravilhosas desse JESUS: ressuscita os mortos, cura os enfermos, em uma só palavra, é um homem de justa estatura e muito belo no seu aspecto. Há tantas majestade no rosto, que aqueles que o vêem são forçados a amá-lo ou temê-lo Tem os cabelos da cor da amêndoa bem madura, são distendidos ate as orelhas e das orelhas ate as espáduas, são da cor da terra, porém mais reluzentes
Tem no meio de sua fronte uma linha separando os cabelos, na forma em uso nos Nazarenos.  O seu rosto e cheio, o aspecto e muito sereno, nenhuma ruga ou mancha se vê em sua face de uma cor moderada, o nariz e a boca são irrepreensíveis.
A barba e espessa, semelhante aos cabelos, não muito longa, mas separada pelo meio. Seu olhar é muito especioso e grave; tem os olhos expressivos e claros, o que surpreende é que resplandecem no seu rosto como os raios do sol, porém, ninguém pode olhar fixo o seu semblante, porque quando resplende, apavora, e quando ameniza, faz chorar, faz-se amar e alegre com gravidade
Diz-se que nunca ninguém o viu rir, mas, antes, chorar. Tem os braços e as mãos muito belos, na palestra, contenta muito, mas o faz raramente e, quando dele alguém se aproxima, verifica que é muito modesto na presença e na pessoa. E o mais belo homem que sê possa imaginar, muito semelhante à sua Mãe, a qual é de uma rara beleza, não se tendo, jamais visto, por estas partes, uma mulher tão bela’ Se a Majestade Tua, o Cesar, deseja ver este JESUS, como no aviso passado escreveste, dá-me ordens, que não faltarei de mandá-lo o mais depressa possível
De letras, faz-se admirar de toda a cidade de Jerusalém, Ele sabe todas as ciências e nunca estudou nada. Ele caminha descalço e sem coisa alguma na cabeça. Muitos se riem, vendo-o assim, porem, em sua presença, falando com Ele, tremem e O admiram
Dizem que um tal homem nunca fora ouvido por estas partes.  Em verdade, segundo me dizem os hebreus, não se ouviram, jamais, tais conselhos, de tão grande doutrina, como ensinam este JESUS. Muitos judeus o têm como Divino e muitos me querelam, afirmando que e contra a Lei de Tua Majestade.  Eu sou grandemente molestado por estes malignos hebreus
Diz-se que este JESUS nunca fez mal a quem quer que seja, mas ao contrário, aqueles que o conhecem e com Ele tem praticado, afirmam ter dele recebido grandes benefícios e saúde, porém a Tua obediência estou prontíssimo, aquilo que Tua Majestade ordenar será cumprido
Vale, da majestade Tua, fidelíssimo e obrigadíssimo
Publius Lentulus

Senador da Judéia Lindizione sétima, luma seconda — Documento dos Arquivos do Duque Cezarini . Acervo da Biblioteca de Roma da, Ordem dos Padres Lazaristas.
https://www.youtube.com/watch?v=KlTm-xG3pO0

sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

Lições de uma viagem à Espanha. José Mauricio de Carvalho






Estando recentemente na Andaluzia-Espanha para evento acadêmico não poderia deixar de visitar, ainda que apressadamente, alguns lugares representativos da região. E fui a eles com o olhar encantado do turista e crítico do estudioso. De um lado, desejoso de conhecer elementos da presença árabe na região, em razão da influência que deixaram na Península Ibérica em Portugal e Espanha e de outro, querendo entender como os espanhóis mantêm esses monumentos grandiosos e o significado que o turismo tem para eles.
Para exemplo da presença árabe nada é mais representativo que o Palácio de Alhambra (Calat al Hambra ou fortaleza vermelha), o magnífico monumento situado junto à cidade de Goa e reconhecido pela Unesco, como patrimônio da humanidade, desde 1984. Este maravilhoso monumento foi edificado entre os anos de 1333-1391 pelo sultão Yusut I e seu filho Mohamed V. Os reis de Castela tomaram a fortaleza um século depois, em 1492, ano em que Colombo chegou à América. Portanto, um ano de glória para a Espanha. O Palácio ainda conserva parte dos arabescos originais em ouro, vermelho e azul, boa parte deles reconstituída em processos de restauro bem conduzidos. No palácio vê-se a presença da água, em fontes e canais muito importante na cultura árabe. Muita coisa foi feita no interior da fortaleza posteriormente, inclusive um mosteiro. Unindo o magnífico conjunto de edificações um maravilhoso jardim com canteiros e fontes. Como deles não havia qualquer registro histórico fidedigno foram reconstituídos de modo a dar uma ambiência próxima ao que seria o lugar. Também foram levantadas de novo as torres que o exército de Napoleão Bonaparte explodiu. Todo esse ambiente recomposto e maravilhoso remete à Idade Média e a ocupações posteriores. Contudo, muito do que ali está é uma recomposição pura e simples, boa parte sem qualquer purismo histórico, apenas para dar majestade ao que já é monumental.
Outro conjunto de edificações que chama atenção é a Plaza de España em Sevilla, o mais impressionante conjunto arquitetônico da cidade. Construída em 1929 para a exposição ibero americana, a Plaza de España foi levantada em tijolo e cerâmica em estilo neo-clássico e gótico, com um canal interior e semi-circular e quatro pontes em estilo mourisco, tudo ornado por um jardim maravilhoso. Apenas para lembrar os estilos arquitetônicos empregados neste conjunto de edificações estavam quinhentos anos deslocado do seu tempo, como os jardins e fontes de Alhambra (patrimônio cultural da humanidade) é uma reinvenção.
Felizmente para os espanhóis, os milhares de turistas que visitam o monumento e deixam uma fortuna da região não se colocam essas questões acadêmicas que muito encantam as autoridades e técnicos preservacionistas no Brasil. E isso para não falar de cidades inteiras que estão sendo reerguidas em outros países europeus apenas por serem referência afetiva para os povos, mas que naturalmente depois de refeitas irão arrecadar milhões de dólares anualmente. É uma boa lição a ser aprendida se quisermos ter de fato um turismo na região que falha a pena.


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