No
livro Imagens do Bem e do Mal, Martin
Buber mencionou dois momentos marcantes onde se tratou o problema do mal frente
a uma realidade Absoluta ou Deus. No oriente e na antiga Grécia acreditava-se
que os homens e deuses habitavam a mesma terra e deviam viver sob as mesmas
leis, formando uma única comunidade. Os pré-socráticos tinham, por verdade
inquestionável, a submissão do homem à essa ordem sagrada do mundo e à
necessidade de expiar as culpas quando se desobedecia tal ordem. Platão pensava
diferente, mas não venceu a posição tradicional e os sofistas que vieram depois
dele promoveram profunda crise cultural ao relativizar os valores e colocarem o
homem como medida das coisas. As dúvidas dos sofistas promoveram verdadeiro
caos no mundo antigo. A outra tentativa de abordar o mal diante de um Absoluto foi
feita pelos hebreus. Eles aceitavam que as leis oferecidas ao povo no Sinai eram
divinas e desobedecê-las levava ao castigo. Nesses casos, o vínculo entre o
religioso e o moral só pode ser considerado se o homem for livre e responsável
para obedecer a essas leis. Nisso está a base da autonomia e liberdade humanas
pela qual o homem faz escolhas. E essas escolhas comportam a possibilidade de escolher
o mal.
O
citado livro de Martin Buber nos apresentou como se compreendia o Bem e do Mal
no mundo antigo diante de uma exigência absoluta, o que inaugurou o problema da
realidade do mal. Para tratar disso a Bíblia associou duas tradições distintas,
uma mais própria dos povos semitas que falava na queda para o mal a partir das
escolhas humanas (episódio da desobediência de Adão e Eva no Éden) e a outra
vinda do oriente, especialmente da Pérsia, que entendia o mal como realidade
radical que se contrapunha ao bem. Dessa segunda tradição é exemplo a revolta
de Lúcifer contra Deus (Is. 14) ou a insatisfação do grande Querubim (Ez. 28)
que foi lançado nas trevas. Nas duas tradições, a vida humana se desenvolve nas
escolhas que faz diante do mal.
Além
da tradição bíblica e da forma como o tema foi tratado antes de Sócrates, o
ocidente também examinou a escolha do mal a partir dos modelos éticos fruto da
meditação filosófica. Esses modelos se desenvolveram desde a antiga Grécia,
Aristóteles foi o construtor de um primeiro e sistemático modelo ético, modelo cristianizado
por Santo Tomás, ao qual se contrapuseram as éticas modernas racionalista e
empirista, a ética kantiana do imperativo da razão e a ética dos valores de Max
Scheler. Todas reconhecem a autonomia do homem e sua possibilidade de escolher
o mal, embora considerem o mal de maneira distinta.
A
questão da escolha do mal nesses últimos modelos éticos (Kant e Scheler), além
de não fugir da tradição de que é possível escolher o mal, adiciona o problema
de entender as diferentes formas de querer o mal. Em síntese, pode-se dizer que
se pode querer o mal simplesmente cedendo aos desejos e inclinações
instintivas, rebaixando o homem ao nível dos animais. Nesse caso, evitar o mal
significava kantianamente conter os desejos da besta fera. Se essa besta não
for contida a responsabilidade afasta-se da liberdade e a pessoa age para obter
o prazer do momento. Uma segunda forma de escolher o mal é se omitindo em
situações difíceis, escolhendo o bem apenas quando isso não a prejudica ou não lhe
pede grande esforço. Foi o que fez Pilatos no julgamento de Jesus. E há ainda
uma terceira forma de querer o mal: é praticá-lo com gosto, desejar escolher o
mal. Frankl relatou que nos campos de concentração havia aqueles que gostavam
de fazer o mal. Frankl escreveu (Fundamentos
antropológicos da psicoterapia. Rio de Janeiro: Zahar, 1978, p. 179): “nos
campos de concentração os homens se diferenciavam. Os salafrários deixavam cair
as máscaras. E os santos se manifestavam. A fome fazia vir a qualidade de cada
um.” Isso é assim porque os homens podem escolher e há os que escolhem praticar o mal em suas diversas formas.
Mesmo os santos lutavam contra o mal que habita dentro do homem, o medo de Paulo, era voltar a ser Saulo.
ResponderExcluirParece que o mal é humano, precisa ser dominado,está no que aprendemos como pecado, aí estão os vícios, inveja,cobiça, raiva...
ResponderExcluirMuito para pensar e nos avaliarmos.
ResponderExcluirSim, se vê pessoas pagando grandes valores para pessoas fazerem o mal, destruindo vidas,não pegam a arma, mas pagam para matar, as vezes o físico outras o emocional.
ResponderExcluirConter a fera,sempre podemos nos surpreender, humanos escondem suas feras, aparecem dissimuladas, mas ferem e destrói seu semelhante.
ResponderExcluirSim, é possível querer o MAL,temos sentimentos ruins.
ResponderExcluir