Já são passados trinta anos
do Golpe da Praça Vermelha em Pequim. A situação da China em 1989
poderia ser comparada a uma República capitalista, só que ao inverso. Num
ambiente tal, capitalista, haveria uma classe incrustada no poder. Seria uma
elite política atuando com repressão e corrupção, obrigando o
povo ou algum segmento, a rebelar-se. Isto normalmente aconteceria num regime capitalista
ditatorial.
Na China aconteceu a mesma
coisa, só que o regime era socialista, o segmente incrustado no poder era uma
nomenclatura do partido que excluía as classes menos privilegiadas, agiam
patrimonialmente em relação à economia, misturavam o bem público com o privado,
sufocando de tal maneira as liberdades das minorias que obrigou o levante
popular através dos estudantes e intelectuais, oriundos de diversos grupos. Os
intelectuais entendiam que o Partido Comunista era demasiado repressivo e
corrupto, os trabalhadores urbanos, operários, cansaram de esperar pelas
reformas e estavam angustiados pelo alto índice de desemprego. O estopim da
revolta iniciou com o falecimento de Hu
Yaobang, líder da República Popular da China. Era considerado protetor dos intelectuais
e dos defensores de uma abertura do regime comunista chinês. Propunha também
uma distensão econômica. Acenava para um culto racional, e não cego, ao líder
da República Popular, Mao Zedong. Naquele início de junho, de três para quatro,
a capital chinesa virou um inferno. É que o Partido Comunista decidiu
transformar em ação as ameaças que vinha fazendo há algumas semanas numa mesma
intensidade em que aumentavam os protestos de estudantes e cidadãos. Foi
literalmente um massacre covarde de uma população pacífica e indefesa. Foram
horas de horror dantesco na Praça de Tiananmen, fazendo jus ao nome de Praça Vermelha.
Os protestos atingiam no
centro de Pequim, o coração da China, desde a Cidade Proibida ao Norte, o
Grande Salão do Povo ao oeste, o mausoléu de Mao, tudo foi tomado pelos
estudantes universitários. Bandeiras, barracas, estandartes, transformou-se num
mar de sangue pelo exército do governo. Foi uma longa noite, pior que a de São
Bartolomeu. Foram centenas de milhares de cadáveres espedaçados, pendurados,
esvaindo-se em sangue. Quantos morreram? Ninguém sabe. O cérebro do governo
perdeu a memória, uma amnésia repentina e geral, depois que os tanques limparam
a praça da Paz Celestial.
Ainda hoje, o 4 de junho, é
proibido de ser mencionado. As jovens gerações não sabem o porquê. Se alguém
tentar, a censura digital bloqueia tudo. E à medida que os mais velhos dos
Delegados da Assembleia do Povo são substituídos pelos mais jovens, a memória
se torna sempre mais embaçada e chegará ao olvido para sempre.
Este acontecimento traz à mente as palavras de Yosef Hayim Yerushalmi referindo-se aos campos de extermíno:
"...os assassinos da memória, os que misturam tudo o que aconteceu em nosso tempo, falam de um indistinto "século da barbárie" e acabam colocando no mesmo plano as vítimas e os verdugos ou negam a existência dos perseguidos e seus algozes..."
Um artigo muito esclarecedor, como sempre.
ResponderExcluirParabenizo REFLEXÃO.
Trinta anos, os esquecimentos coletivos são rápidos, permanecem os vazios para quem perdeu.
ResponderExcluirEstão apagando a memória.
ExcluirÉ incrivel, medir o tempo, as memórias logo vão mudando, uma mentira muitas vezes repetida vira verdade, o exemplo está no momento que vivemos, bandidos viram heróis, heróis são esquecidos, até banidos da história, as verdades vão se perdendo.
ResponderExcluirMuito triste, as manipulações coletivas.
Um mar de sangue que mudou a realidade para as novas gerações.
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